Acordo Mercosul-UE inibe indústria brasileira, alertam especialistas

Acordo Mercosul-UE inibe indústria brasileira, alertam especialistas
Acordo Mercosul-UE inibe indústria brasileira, alertam especialistas

Pressionado pelos europeus para assinar o acordo, o governo brasileiro elevou o tom de crítica ao tratado que visa integrar o Mercosul à União Europeia. Presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou pontos do acordo “inaceitável” ou de “ameaça” para o Brasil.
Para os especialistas ouvidos pela Agência Brasil, os termos do acordo prejudicam o projeto de industrialização do Brasil defendido pelo governo Lula e representam mais a proposta de ampla abertura comercial promovida pelo governo anterior.

Os quase 30 anos de negociações entre os dois blocos econômicos foram acompanhados pelo professor de Relações Internacionais e Economia da Universidade Federal do ABC paulista (UFABC), Giorgio Romano Schutte. Para ele, o acordo impede que o neo-industrialização propostas pelo novo governo.

abertura de mercados

“Este acordo significa facilitar a abertura de mercados para a indústria avançada na Europa, nomeadamente a Alemanha, e por outro lado, fortalecer o Brasil como agroexportador de produtos in natura. Não há nada sobre transferência de tecnologia. Como se o Brasil não tivesse o direito de se industrializar”, opinou Schutte, membro do Observatório de Política Externa e Inserção Internacional do Brasil (OPEB).

Ele acredita que o acordo avançou no governo Bolsonaro porque prevaleceu o entendimento de que a liberalização total do comércio exterior era o objetivo a ser perseguido.

“Então os europeus querem esse acordo que foi negociado com os ultraliberais do governo Temer e do governo Bolsonaro, mas não gostam da imagem do Bolsonaro. Não passaria em congressos e teria ampla oposição da opinião pública”, analisa o professor. Para ele, os europeus estavam protelando a não assinatura do acordo com Bolsonaro, que consolidou uma imagem negativa em relação aos mecanismos de proteção ao meio ambiente.

Para o professor adjunto de economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Pedro Paulo Bastos, o acordo é assimétrico, favorece o bloco europeu e abre muito o setor de serviços e a indústria no Brasil. “Não é imediato, mas (o acordo) tem um cronograma para a eliminação de tarifas (aduaneiras) em vários ramos, ou para uma redução brusca de tarifas em quase todos os ramos”, explicou.

Bastos acrescentou que, para o governo brasileiro, é fundamental conseguir estimular novas indústrias que precisam de algum grau de proteção. “Por exemplo, indústria de software, biotecnologia, indústrias de ponta. Não dá para importar sem limites, muita gente depende de emprego no setor, até porque nem todo mundo consegue trabalhar em uma fazenda de soja, que emprega muito pouco”, opinou.

Entre os pontos criticados pelo governo, destacam-se as compras governamentais, que abrem concorrência para empresas europeias. “Eles querem que o governo brasileiro compre coisas estrangeiras em vez de coisas brasileiras. E se não aceitarem a posição do Brasil, não há acordo. Não podemos abdicar das compras governamentais, que são a oportunidade de sobrevivência das pequenas e médias empresas neste país”, disse o presidente Lula.

CNI apoia convênio

Mesmo com essas críticas, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) apoia o acordo. no artigo publicado em maio deste ano, o presidente da entidade, Robson Braga de Andrade, afirmou que “é urgente avançar para a assinatura do tratado em seu formato atual, sem reabrir as negociações comerciais. Isso deveria ser uma prioridade do governo.”

O representante da CNI afirma que, com o acordo, a tendência é de redução dos custos dos insumos importados e de aumento da demanda europeia por produtos industriais brasileiros.

“Nossas estimativas são de que cerca de 40% de todos os produtos oferecidos pela União Europeia no acordo – e que estão sujeitos a algum tipo de tarifa em suas alfândegas – deixem imediatamente de cobrar imposto de importação ao entrar no bloco europeu”, analisado.

O professor Schutte acredita que a posição da CNI se deve ao fato de os industriais brasileiros, em grande parte, terem desistido do projeto de industrialização. “Eles não acreditam mais em um projeto de industrialização. Eles jogaram a toalha. Preferem importar o maquinário”, avalia o professor, que considera que o presidente Lula tem poucos aliados para o processo de reindustrialização.

Para o professor da Unicamp Pedro Paulo Bastos, “muitos deixaram de ser concorrentes industriais e passaram a ser montadores ou revendedores, quando muito, sócios menores” de indústrias estrangeiras.

desindustrialização

Segundo dados do Banco Mundial, o Brasil vem passando por um processo de desindustrialização desde a década de 1980. O peso da indústria no Produto Interno Bruto (PIB, soma de todos os bens e serviços produzidos no país) caiu de 34%, em 1984, para 10%, em 2021.

Foto de © CHINA DAILY/Reuters/direitos reservados
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