Estudo identifica distorções em impostos que afetam a cesta básica
Um estudo realizado pelos economistas Arnoldo de Campos e Edna Carmelio, em parceria com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e a ACT Promoção da Saúde, identificou uma série de distorções nos impostos incidentes sobre a cesta básica brasileira. A pesquisa envolveu tributos federais e estaduais.
O estudo analisou o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do Distrito Federal, Paraná, São Paulo, Bahia e Amazonas e, na esfera federal, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), além da tributação do PIS/Cofins (Programa de Integração Social e Contribuição para o Financiamento da Segurança Social).
“Os estados têm uma regra guarda-chuva que vem do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que tem dois acordos específicos principais sobre cestas básicas”, disse ele ao Agência Brasil economista Arnoldo de Campos. “São regras gerais que autorizam estados e municípios a isentar ou reduzir alíquotas (de itens) da cesta básica.”
O Confaz estabelece diretrizes gerais, mas cada estado, ao aderir ao acordo, faz uma lista e define o que cabe na isenção e redução de impostos. Segundo Campos, a maior parte interessa à cesta básica. “Mas também existem alimentos ultraprocessados. Em alguns estados, é possível encontrar carne enlatada, linguiça, macarrão instantâneo e bebida láctea que, não necessariamente, deveriam ter benefícios fiscais.”
Restrições
Arnoldo de Campos argumentou que, muitas vezes, produtos importantes para pessoas com restrições alimentares, como a farinha de aveia ou a farinha de arroz, para quem tem intolerância ao trigo, têm índices mais elevados e são considerados “alimentos ricos”. O economista lamentou que os produtos da biodiversidade, que são alimentos regionais, não façam parte da cesta básica. “Existem vários tipos de distorções: é benéfico para o macarrão instantâneo e não para esse tipo de alimentação, que, para muitas pessoas, é básica.”
O estudo encontrou diferenças principalmente na lista de produtos e taxas. O Amazonas aderiu a um dos acordos que incluem redução de impostos. “Mas é a menor redução. A Amazônia tem hoje a maior carga tributária em cima da cesta básica”, dizem os economistas. Alguns itens, caso venham de outros estados onde não há produção local, como o feijão, enquadram-se na regra geral de alíquotas mais altas. Outros estados, como o Paraná, já estão testando alguns itens da cesta básica, como a farinha de aveia. “Há um pouco mais de preocupação em diversificar e ampliar a lista.”
Em São Paulo, a regulamentação do ICMS concede isenção de impostos para produtos como margarina e creme vegetal, presuntos, biscoitos e bolachas, além de embutidos, embutidos e mortadelas, por serem considerados “essenciais”, segundo a legislação brasileira.
Arnoldo de Campos sugere mudanças na cesta básica, atualizando os alimentos que a compõem, porque “tem pouca orientação e dá muita liberdade ao estado para aplicar como quiser”. A ideia é ter uma cesta que mantenha a questão da alimentação básica e saudável e inclua produtos na naturezaou minimamente processados, que hoje possuem um contrato separado, além dos produtos da biodiversidade regional, com mais variações para que também possam ser incluídos.
Além disso, os economistas propõem que a reforma tributária em discussão tenha uma categoria específica de alíquota para a cesta básica. “A cesta básica tem que ter tratamento tributário diferenciado”, afirmou Arnoldo de Campos.
danos à saúde
A nutricionista Janine Giuberti Coutinho, coordenadora do programa Alimentação Saudável e Sustentável do Idec, destacou que a incorporação gradual de produtos ultraprocessados à cesta básica ao longo dos anos tem prejudicado a saúde da população brasileira. Estudos científicos associam a ingestão desses produtos ao desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis, como câncer, diabetes, hipertensão e problemas cardiovasculares. Em pesquisa recente, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) afirma que o consumo de produtos ultraprocessados está diretamente relacionado a 57 mil mortes de brasileiros por ano. “Mortes prematuras”, enfatizou Janine, em entrevista ao Agência Brasil.
Segundo Janine, o problema foi levado ao governo de transição e agora está sendo discutido com o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias. “Estamos conversando com a Secretaria de Segurança Alimentar e Nutricional para propor uma nova cesta básica, retirando os ultraprocessados da lista de alimentos básicos acessíveis à população brasileira.”
Para o economista, o assunto também precisa ser articulado com o Ministério da Saúde. O Idec e a ACT Promoção da Saúde pretendem levar o tema à discussão nos conselhos nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e de Saúde (CNS) e na Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional, que integra o Sistema Nacional de Alimentação e Segurança Nutricional.
A sociedade brasileira precisa saber que existem distorções na cesta básica e que existem isenções de impostos para produtos nocivos à saúde, disse Janine. “É preciso levar essas informações à sociedade brasileira e a discussão em fóruns importantes para que a política de cesta básica esteja alinhada com a alimentação saudável e sirva de base para o Guia Alimentar para a População Brasileira”.
Janine afirmou que não faz sentido haver isenção de impostos para produtos em que há indícios de risco à saúde. Com a nova regra, a ideia é que os produtos in natura ou minimamente processados sejam o carro-chefe dos itens considerados essenciais na alimentação do brasileiro.