Pacote automotivo: especialista elogia programa, mas questiona prazo

Pacote automotivo: especialista elogia programa, mas questiona prazo

Anunciado esta semana como medida de alívio para o setor automotivo, o pacote que reduz temporariamente a compra de carros, ônibus e caminhões pode não ter o efeito esperado na indústria. Segundo especialistas, a curta duração e o volume de recursos do programa de ajuda podem resultar em um alcance limitado, o que não mudará a situação do setor.
Professor de economia do Ibmec, Gilberto Braga elogia o programa, mas questiona o prazo limitado de quatro meses e o valor de R$ 1,5 bilhão, que considera baixo.

“O ideal seria que o programa tivesse um prazo maior para que o efeito fosse mais duradouro”, diz Braga. Segundo ele, o setor automotivo ainda tem grande peso na economia e na geração de empregos e demandaria mais atenção neste momento de juros altos e restrições ao crédito.

Segundo o professor, no setor de caminhões e ônibus, o prazo limitado do programa pode ter efeito contrário, resultando no endividamento de transportadoras e motoristas sem reservas financeiras e que serão pressionados a tomar uma decisão rápida sobre a renovação da frota.

“Um caminhão tem uma vida útil muito longa. Portanto, uma decisão com impacto em toda uma vida produtiva não pode ser tomada em um curto espaço de tempo”, avalia.

Formatar

O professor elogiou o formato do programa, principalmente a decisão de combinar critérios socioambientais e o peso de determinada marca de veículo no setor para estabelecer descontos, que variam de R$ 2 mil a R$ 8 mil. Segundo ele, o pacote está no caminho certo, mas precisaria ser ampliado para ter um efeito duradouro na indústria automotiva.

“Considero o pacote positivo porque acumula diversos elementos que atendem às demandas de um setor importante para a economia, que ainda tem as rodovias como seu principal eixo modal”, diz Braga.

A concessão de descontos é baseada em um sistema de pontuação que avalia três critérios. Preços baixos (para priorizar modelos populares), equipamentos antipoluentes (para incentivar a compra de modelos menos poluentes) e geração de empregos na indústria e utilização de peças nacionais (para premiar marcas de maior peso na indústria nacional).

Para ônibus e caminhões, o desconto está vinculado ao compromisso de enviar veículos com mais de 20 anos para reciclagem, sendo necessária a comprovação de que o comprador enviou o veículo antigo para desmontagem.

créditos fiscais

Constituído na forma de créditos tributários (desconto de impostos futuros), o pacote de ajuda consumirá R$ 1,5 bilhão – R$ 700 milhões para caminhões, R$ 500 milhões para automóveis e R$ 300 milhões para ônibus e vans. Diferentemente dos programas anteriores, em que o governo reduzia o Imposto sobre Produtos Industrializados, mas não tinha garantia de que os fabricantes repassariam o desconto, o novo pacote incentiva as concessionárias a venderem mais barato e repassar o crédito tributário para a indústria.

Diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão consultivo do Senado que faz análises econômicas, a economista Vilma Pinto diz que o sistema de crédito tributário representa uma novidade. Ela considera o volume de R$ 1,5 bilhão baixo em relação à receita total do governo (estimada em R$ 1,911 trilhão pelo Ministério do Planejamento). No entanto, ela diz que o pacote vai na contramão do novo quadro fiscal.

“Na verdade, não haverá impacto fiscal devido à regravação parcial do diesel (que terá PIS e Cofins majorados em R$ 0,11 em três meses), mas esse R$ 1,5 bilhão para o programa, cujo impacto tem sido neutralizado no momento, pode ser necessário no futuro porque o governo está empenhado em buscar receitas para cumprir as metas ambiciosas propostas no novo quadro”, comenta o diretor do IFI.

Segundo Vilma Pinto, a agência ainda não calculou quantos empregos o programa deve gerar nem o impacto no Produto Interno Bruto (PIB, somatório dos bens e serviços produzidos). Com relação à inflação, ela diz que o impacto do aumento do preço do diesel nos índices de preços pode ser baixo por causa dos veículos mais baratos.

transporte coletivo

Inicialmente restrito a carros populares, o programa atraiu críticas de ambientalistas por não ter medidas de incentivo ao transporte coletivo. A decisão de incluir a reforma de ônibus, caminhões e vans, diz o professor Gilberto Braga, reforçou o caráter ambiental do programa. Segundo ele, um prazo maior para a renovação dos veículos pesados ​​favoreceria a transição energética, estimulando inclusive, neste momento, a compra de veículos movidos a diesel.

Transporte coletivo na região central do Rio de Janeiro

Transporte coletivo na região central do Rio de Janeiro – Tânia Rego/Agência Brasil

Segundo o professor, o ideal seria que o incentivo de curto prazo fosse conciliado com uma política industrial para a produção de veículos elétricos. “A transição para veículos elétricos é gradual. No momento, é oneroso para o público. Enquanto os preços dos carros elétricos ou híbridos não caírem, os carros tradicionais continuarão competitivos”, aponta. “Na verdade, não vejo como seria possível abrir mão da tradicional cadeia produtiva da indústria automobilística, que é um dos pilares da economia do país.”

A professora cita o exemplo do modelo Renault Kwid. Segundo Braga, enquanto a versão tradicional custa em torno de R$ 60 mil (incluindo o desconto do pacote), a elétrica sai por R$ 140 mil. “É o carro elétrico mais barato do Brasil no momento, inacessível à maioria da população”, aponta.

Foto de © Rovena Rosa/Agência Brasil
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